quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A falta da cabeleira do Zezé

Pra toda mulher que faz quimio a 1a. grande questão é como vai ficar meu cabelo. Sim, porque careca é coisa de homem, a gente costuma olhar para aquelas carecas esquisitas que se formam perto dos 40 anos e fica imaginando como aquele homem vai ficar ainda mais velho. Aliás se for namorado ou marido a gente começa a fazer força pra achar a careca bonitinha!
Sim, bonitinha nele, mas nunca não na gente que fique claro.

Mulher nasceu pra ter cabelo pra poder alimentar a indústria das tinturas, dos sprays, das mousses, das fivelas, das escovas....a mulherada praticamente carrega essas indústrias nas costas! Por mais metrosexual que o cara seja, ele não vai usar fivela ou fazer hidratação no cabelo.....convenhamos!!
O cabelo preocupa muito mais uma mulher do que a quantidade de celulite que ela tem, já que ele está bem no alto da sua cabeça! A celulite ela esconde o ano inteiro com roupa!
O cabelo da mulher é fonte de sedução, de trejeitos, de maneirismos incontrolados....amarrar, levar a franja de um lado pro outro, prender com uma piranha e deixar cair despropositadamente fios aqui e ali....que mulher quer perder esse aliado??
Não é à toa que o sansão quebrou o maior pau com a Dalila quando ela resolveu cortar o cabelo dele!!

Desde que o câncer foi diagnosticado e eu soube que a medicação não deixaria ele cair, fiquei muito aliviada. Primeiro pq eu não estava com a menor vontade de lidar com aquilo naquele momento. Entrar no mundo quimioterápico é uma viagem incerta, tensa e assustadora. Um trem fantasma mesmo!! Cabelo não era um tópico, mas toda vez que mudava a medicação eu queria saber se cairia ou não; ou seja, no fundo eu me preocupava sim. A careca é a materialização da doença, ela agride o outro talvez porque ele não tem forças pra lidar com a sua doença e tem que cuidar da sua postura diante do enfermo. Estar careca e ser mulher é praticamente a tradução de estar com câncer.

Foi na 3a. linha de tratamento que ele começou a cair. Eram tufos que ficavam espalhados por onde eu passava e que me dava a sensação de estar morrendo aos poucos. Não pensei 2 vezes e resolvi tosar: Máquina Zero, Elena!! bradei à minha cabeleireira. Não tinha tempo, disposição e paciência pra lidar com esse pepino!

Problema resolvido....cria-se outro: e agora, o que eu faço com essa careca aí?!Como eu vou sair na rua?!É como ter uma bunda no meio da sua cabeça!!

Acabou que algumas mulheres vieram me perguntar sobre a sensação da careca. Resolvi escrever esse post porque nesse domingo, minha amiga Regina levantou essa questão. Essa e mais outras tantas que dão a maior curiosidade na mulher.

O cabelo é a moldura do rosto, todo mundo quando compra um quadro porque acha ele lindo, mas depois que faz a moldura passa a achá-lo magnífico. Até hoje quando acordo e me olho no espelho da porta do banheiro além de não me reconhecer logo de cara, tenho a sensação de estar entrando na câmara de gás de um campo de concentração, porque naquele momento em que vc acabou de sair da cama e não se arrumou ainda, a cara é sim a de um ser indefeso, e do meu ponto de vista eles retratavam essa condição, eles eram como nós vítimas de uma crueldade. E nós, somos como eles, uma multidão de indefesos vítimas de uma crueldade!

É claro que depois de 1 mês eu já estou mais habituada, ganhei um container de lenços de todas as cores, tamanhos e tecidos, praticamente todo mundo já me viu e maquiada e com brincos, fica uma cara diferente mas interessante!
O lenço esquenta, como dizem que a peruca também esquenta. Fui várias vezes convidada pelas minhas amigas a fazer uma peruca ou mais de uma pra poder variar. Não dá....não acho tão simples assim mudar de aparência, carregar um cabelo que sabe lá Deus de quem foi e como ficou sem ele....blagh nem pensar!! Me dá meus lenços já!!!

O 1o. banho foi a coisa mais ridícula do mundo. Quando cheguei em casa da minha tosa, fui tomar banho. Eu sou o tipo de mulher que odeia cabelo molhado (na praia inclusive). Tenho aflição! Assim sendo sempre usei toca de banho pra não molhar minha juba. Não sabia se colocava a touca oou não (eu sei.....ridículo, pode me xingar!!). Achei que devia, mas a estática me impediu. De repente a pouca quantidade de cabelos que sobrou se arreganhou e eu fiquei louca pra tirar aquilo da minha cabeça.
Bom, já que não ia ter touca precisava decidir se lavava com shampoo ou com sabão. Fiquei horas naquele dilema fora do box, claro! A água correndo e eu lá (os defensores da Água no planeta me perdoem....eu tb sou, mas dessa vez estava em momento muito delicado)..lavar ou não lavar eis a questão!
Lava sua covarde!!! Urrava minha voz interior!
Então tá...entrei no box, deixei a água escorrer no meu corpo e ploft! Me meti embaixo do chuveiro de cabeça!
Dava pra ouvir aquela musiquinha que tocava quando o Senna ganhava: tãtãtã...tãtãtã!!

Socorro!! Quase gritei, porque aquela água descendo pelas minhas entranhas encefálicas estava me dilacerando! Que sensação horrorosa, estranha....... e ao mesmo tempo, libertadora!

Hora de lavar: me decidi pelo shampoo, afinal ele foi feito pro cabelo, o sabonete não! Peguei o que sempre uso, abri e virei na palma da minha mão com toda delicadeza .(Coloquei tanto shampoo, mas tanto shampoo que dava pra lavar a cabeça de todos os integrantes da Unidos do Tucuruvi!!!
Dane-se, não dava nem pra devolver no pote, tive que jogar fora....(sorry ativistas, eu tb sou, mas foram as circunstâncias que me impediram de ser politicamente correta!). Agora vamos esfregar na careca!

HEEEEEELPPPPPPPPP!!

Que horror!! Aquela cabeça pelada, parecia uma bunda de bebê com pêlos de vikings!!! E aquilo era meeeeu!! A minha nova moldura!!No topo da minha cabeça!!! No alto do meu intelecto....

Deus dai-me serenidade, porque se o Senhor me der forças eu mato um!!

Calma Lela, pensava comigo, com o tempo você se acostuma! Você tem um grau de adaptabilidade muito alto, lembra?! Respiiiira fuuuundo!!!

Lavei morrendo de aflição, mas lavei. É difícil explicar, mas a sensação é a mesma de quando você fica com gesso muito tempo e tira. O contato da pele com a água é absolutamente estranho!!

Quando o banho acabou veio outro dilema: Secar!!

Lela não seja tão buuuurra criatura, vai usar secador de cabelo pra que se não tem cabelo!! - pensei logo antes que o mico ficasse eternizado na minha memória!

Claro que podemos passar a toalha, que nem homem faz quando sai do banho!Como não pensei nisso antes?!
Ah tá, claro...passar a toalha. Mas a que tomei banho ou a que uso só pro cabelo?!

Jesus, Mary aaand Joseph, vai logo criatura, acaba com isso de uma vez!!!

Que sensação hor-ro-ro-sa!! É como colocar a mão naquele brinquedinho de criança que é uma caixa de ferrinhos, como se fossem alfinetes e que quando a gente tira fica a marca da mão! É, a mesma coisa que uma cama de faquir!!Gostoso né???

Meu banho devia ser um momento refrescante, relaxante e esperado!!
Agora virou meu momento na masmorra!
Uma tortura humilhante!!!

Claro que depois de 1 mês o cabelo deu uma crescidinha (assim: branco e grisalho em cima, preto embaixo) e até a coitada da pobre da minha careca foi se acostumando com a água batendo na sua superfície e com a Jessica e a Pamela vindo pra cima de mim querendo beijar a minha carequinha: "Deixa eu dar um beijinho nessa carequinha, deixa?!!"

Sai pra lá garota, tá me achando com cara de que?? Zezé?!!Eu hein!!!

Um comentário:

  1. Lelinha minha linda, você é demais! Que bom que usou o dom da sua escrita, da sua espontaneidade e do prazer pela vida para continuar iluminando nossa rotina!
    Beijos!

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