quinta-feira, 22 de setembro de 2011

A difícil arte de encontrar o equilíbrio

"Certa vez perguntaram a um índio, por que ele estava sentado à beira da estrada. E ele respondeu: Paro de vez em quando, para que minh'alma se junte a mim!"

Desde que me conheço por gente, a atividade física fez parte da minha vida. Não, eu não era aquela aluna que adorava correr na aula de educação Física no ginásio pra fazer o aquecimento , eu era aquela que tinha um tênis que teimava em não ficar amarrado o que me fazia parar 30 vezes durante o exercíco. Eu também não fui aquela adolescente que ia depois da aula na ginástica pra ficar fazendo aqueles exercícios horrorosos 500 vezes porque achava divertido.Mas de alguma maneira, eu sempre procurei fazer o que eu gostava: jogar volley, aulas de jazz, bicicleta ergométrica.

Nessa época eu não me exercitava por amor ao esporte, ou por gostar de suar. Não, o único, entenda ÚNICO motivo era pra não engordar, ou pra emagrecer, o que está profunda, direta,e inexoravelmente linkado!!

Não fui uma criança magrinha (aliás, quando se descende de armênio e espanhol, ser magra é no mínimo um desafio impossível!!).
Não fui uma adolescente enxuta.
Não fui uma mulher com quilos a menos, mas sim com poucos a mais, mas eles sempre estiveram por lá.
Também confesso, nunca tive reclamação, mas poucas vezes fiquei de bem do meu corpo.
Sempre comi salada, grelhados, frutas, verduras não porque faziam bem, mas porque emagrecia, ou não engordava. Hoje eu como até abacate sem medo de engordar. Bright side of my cancer: eliminei desde janeiro 6kg e meio e por mais que coma, não engordo!! Uhuuu!!

Acho que conforme os anos vão passando, e lá já se foram 47, a gente começa a perceber que o cuidado com si mesmo pode fazer uma diferença enorme na vida.

Uma coisa que sempre quis fazer na infância, mas nunca tive coragem foi nadar. Imagina, eu com aquelas coxonas pondo maiô e batendo aqueles pernis dentro da piscina?? Iam chamar o Ibama e avisar que uma Jubarte tinha perdido a rota!!

Mas depois dos 30, resolvi sair da piscina de hidroginástica e pular pra de natação. Eu era casada, as meninas pequenas e eu nadava das 7h15 às 8h30. Quando chegava em casa, elas estavam no comecinho do dia e eu refeita. Nessa época, meu casamento estava um pouco difícil, as diferenças pesavam cada vez mais, e nadar, ouvir a minha respiração, sentir as bolinhas d'água percorrendo meu corpo, me faziam tão bem que não me importava se era inverno, verão, se chovia ou fazia frio, 3 vezes por semana eu saia da cama e encarava a piscina. Nadava normalmente 1.900m por dia.E pouco me importava se meus pernis estavam expostos ao público.

Aos 38, tive uma briga feia com meu marido (o relacionamento que já não estava bom, agora era péssimo) e decidi sair do conforto da piscina pra encarar aulas de body pump. Na realidade no mesmo lugar onde eu fazia natação, um antigo professor de aeróbica, o Fábio Guimarães estava dando aulas, e a aula dele era beeem puxada. Meu irmão que o diga, tinha uns 20 anos quando fazia aula com ele, e o Alex resolveu encarar comigo. A aula começava às 6h30 da manhã. Ele rolava naquela cama, me xingava,falava que era muito cedo, resmungava do cara,falava que ele dava em cima de mim, que ele era muito mal humorado, mas a aula tinha 40 alunos e todos felizes e saltitantes, repito: às 6h30 da manhã. Exceto o Alex!

Um belo dia o Fábio me falou pra ir correr, pra dar uma secadinha!!

Pera. Correr? Mas eu só sei amarrar o tênis, como eu vou correr??

Comecei na esteira, mas como era chato... haja fôlego...10 minutos, 20, 30, 40!! Uhuuu!!
E se eu for correr no Parque? Deve ser no mínimo mais interessante!

Nossa.......isso pra mim era um sonho, achava super cool, in, fancy, só pessoas muito top deviam "correr no Parque". Aquilo era o máximo no meu conceito esportivo!!
Não custava tentar, afinal, eu sou privilegiada de morar a 10 quadras do Ibirapuera!
No começo ia de carro, estacionava lá perto,e ia correr.

Foi fascinante. Aquilo era muito melhor do que jamais poderia imaginar! Claro, que pra não deixar meu hábito de lado, eu ia cedinho.Umas 6hs. E, 3 vezes por semana.

Mantive esse ritmo por muitos anos, o bacana da corrida num lugar aberto,e num parque, é poder estar em contato com a Natureza, ouvir os passarinhos, os cachorros, ver e reconhecer pessoas estranhas que estão lá nos mesmos dias que você e pelo mesmo motivo, dar nome pra elas, imaginar suas vidas! E saber que você só precisa de um bom tênis, tanto faz a roupa, e você não paga nada por isso!

Depois de uns minutos de corrida, as ideias fluem, os problemas se dissolvem, o raciocínio fica mais fácil.E no final, o corpo fica em paz.

Estou voltando pro Parque, não às 6 da manhã,mas umas 7h30, 8hs! Pra caminhar, pra mexer meu corpo que como o seu, é um templo e que deve ser muito bem tratado, seja lá pelo motivo que for: pra emagrecer, pra ficar durinha, pra ter barriga de tanque, pra ficar mais jovem, pra ser saudável ou simplesmente pra ficar equilibrado.

Fico pedindo a Deus que me ajude a voltar a correr, tenho receio por conta do portocath (um cateter implantado cirurgicamente na subclave pra aplicação da quimio), imaginar ele se mexendo dentro de mim ainda me dá uma aflição enorme!
Hoje levo dinheiro pra se me acontecer alguma coisa, a chave do carro e um Ipod (nunca levei nada, saia de casa correndo, dava uma volta no Parque e voltava correndo, sem carregar nada). Celular? NEM PENSAR!!
Aprendi que a música me faz entrar em conexão comigo muito mais rápido e me ajuda a dissolver sentimentos com muito mais facilidade.

No meu melhor momento Flower Power parei hoje pra agradecer a Deus: o verde das árvores, o colorido das flores, o canto dos pássaros,os patos nadando, a quietude do lago.
Já se imaginou morando no branco do Alaska, na aridez do deserto, ou na secura do Nordeste?!

Sabe o que eu quero mesmo indo ao Parque?
Entrar em equilíbrio : mente são, corpo são.
Eu preciso, tu precisas, ele precisa, nós todos precisamos!

A gente se judia muito e pouco pára pra prestar atenção no que este templo que nos acompanha a vida toda precisa. Ele não reclama das suas rugas, ele não fala mal do seu cabelo, não acha suas coxas uns pernis, não diz que seu pé é grande, sua bunda caída, ou sua conta bancária muxiba! Ele está lá, pronto pra te servir a vida inteira, pedindo única e exclusivamente pra que você cuide bem dele. E que se der,pra que você entre em contato com aquele Eu Superior que mora lá dentro, e que talvez esteja precisando de carinho, atenção e cuidado.

Como o Índio, lá de cima, você tem parado pra deixar seu corpo encontrar sua alma?

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Resignação e Resiliência

Resignação - Sujeição paciente às amarguras da vida; conformação com a dor física ou moral; paciência no sofrimento.

Resiliência - Capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças.

Conversando um dia com a Stéphie, descobri que ela está conseguindo superar a perda da avó de uma maneira muito mais tranquila do que imaginava. Ela sempre foi o xodozinho da vovó (e a Jessie do avô), chegamos ao cúmulo de em uma briga ela "fugir" pra casa da avó e morar com ela por quase 1 ano (helloou!!). Elas sempre foram muito ligadas,e eu temia que isso fosse afundá-la de vez.
Mas não foi o que aconteceu, o fato de não tê-la mais por perto ainda é muito triste, e sinceramente não acredito que isso passe completamente nem com tempo nem com chocolate. O buraco não muda de tamanho, não. Isso é fato!
Mas ela me disse que lembra da avó infeliz, sofrendo, com medo do que viria pela frente e sentir que hoje ela está em paz, lhe dá conforto e a deixa feliz. É assim pra mim, e pra Jessie!

Acho que no fundo as pessoas têm uma ideia muito distorcida de sofrimento. Aí o que acontece é que quando você não se enquadra no conceito do outro de dor, você é frio, distante ou calculista.

Eu sempre digo que economizo demais no quesito sofrimento. Não sou de ferro, também choro, me descompenso e fico sem chão. Mas não deixo de pensar durante o processo, e isso é o que faz a diferença.

Um amigo me disse que não sabe como estou me segurando com o câncer e a perda da minha Mãe. Eu respondi: mas eu não tenho o que fazer, é a minha vida! E é!
Eu passei por muita coisa, como muita gente passou e passa. Mas se tem uma coisa que eu me recuso a fazer é brigar com a vida. O que me acontece não necessariamente é obra do destino, do acaso ou de Deus. Faz parte da minha vida....ponto final.

Pra mim isso é ser resignada,o que não é acomodada. Algumas coisas a gente pode mudar e se for melhor tem mais é que batalhar pra isso acontecer, mas outras simplesmente não dá!
Por mais que você se descabele, fale com o Papa, mexa mundos e fundos, não dá! Então porque não aceitar e tentar lidar com aquilo da melhor maneira possível??

Dificilmente (pra não ser metida e dizer que vai ser impossível) você vai me ver jogada na cama aos berros, chorando dizendo que eu não mereço passar por isso ou por aquilo, que Deus está me castigando, que porque isso foi acontecer justo comigo (que sou uma santa, vc não percebeu???!).
Arghh!! Tô fora!! Não me faça confraternizar com pessoas nesse estado que eu não tenho saco (agora nem saúde)!!

O desgaste é maior, a dor fica mais intensa e o problema se mantém do mesmo tamanho quando você não consegue entender que tem que aceitar.

Porque será que as pessoas tem tanta resistência em aceitar o que a vida lhes traz de ruim?
Porque será que é mais fácil reclamar sempre do chefe, do ex marido, do namorado, do salário e da vida, do que tentar mudar ou simplesmente aceitar que aquilo é daquele jeito e não vai mudar?
Porque as pessoas tem tanta dificuldade em minimizar as tristezas e conviver com as perdas como parte da vida?

O mais engraçado é que quando conto pras pessoas o que me aconteceu nesses últimos 8 anos com calma e tranquilidade, elas se espantam e ficam achando que eu vim de outro planeta.
(Pra quem leu o post Escolhas, lá está um "Essa é sua vida" básico pra que fiquemos na mesma página. Quem não quiser ler também não precisa, mas saiba que foi um festival de tragédias!!).

Não vim de outro planeta, mas tenho sim um jeito diferente de aceitar o que me acontece e transformar isso da maneira mais fácil e leve pra que minha vida faça sentido.

(Aliás, queria deixar claro que o blog não é diário, não posto quando não tenho o que falar. Convenhamos que as pessoas já não tem tempo pra nada, estão fazendo a gentileza de ler isso aqui por puro amor à causa, não faço ninguém perder seu tempo se não for por um bom motivo!Não estranhem se eu demorar pra escrever, please! Quero que seu tempo aqui seja no mínimo interessante!Se eu não puder tocar a vida de quem me lê com um mínimo de conteúdo, esse blog pára de fazer sentido. Pronto, recado dado!!).


Conversando com a psicooncologista da Clínica de Combate ao Câncer,a fofa da Dra Fabíola, onde agora faço meu tratamento, soube que até 15 anos atrás as pessoas morriam ou se curavam do câncer. Aí começou a aparecer um grupo que teimava em não morrer e passou a viver com o câncer. São os pacientes crônicos. Tipo...EU!
O fato dela ter me enquadrado numa categoria me deixou tão feliz (tá pode rir, eu sei que é ridículo!!) que é como se eu tivesse sido admitida num clube e agora pertencia a ele. Claro que o Ricky já tinha me falado que minha doença era crônica, mas ele não falou nada sobre ter amiguinhos e pertencer a um time!!
Vai ser um saco fazer quimio pro resto da vida?? Só vai!! Mas eu vou viver com o câncer e ser feliz dentro do que eu conseguir!!
Na 6af uma amiga muito querida, a Sofia, se casou e completou 50 anos. Um casamento impecável, lindo e emocionante, um casal doce, amigo, companheiro que faz a gente pensar que o amor vale a pena!
Valeu cada segundo. Fiquei o sábado com febre e esfarelada, sem energia pra nada, e domingo a febre voltou! Vai ser minha vida daqui pra frente? Sei lá, mas não vou deixar de viver por nada!!

Nessas horas em que não brigo com a vida, mas tento ser o mais resignada possível e me manter resiliente aconteça o que acontecer, sei que não sou melhor que ninguém. Talvez meu grande diferencial (e isso pode ser aos olhos de muitos, boçal ou piegas) seja sentir e ter a certeza de que haja o que houver, tem alguém lá em cima cuidando de mim, alguém que sabe tudo o que eu vivi, e o que eu preciso viver pra ser uma pessoa melhor. Alguém que não sabe só um pedaço da minha vida, mas conhece todas as minhas vidas.

Meu Pai não era nada religioso, tinha fé e olhe lá. Pouco falava de Deus, mas um dia em seu escritório, vi um poema que já tinha lido e que era lindo. Ao perguntar ao S.Geraldo o que ele fazia embaixo do vidro da sua mesa, ele me respondeu: "Eu acredito nele".
Esse poema me acompanha até hoje, nas horas difíceis e nos momentos de dor, quando preciso trazer minha força à tona e quando me sinto frágil e desprotegida.

Enjoy ( aproveite!):

Uma noite eu tive um sonho...
Sonhei que estava andando na praia
com o Senhor, e no céu passavam cenas de minha vida.
Para cada cena que passava, percebi que eram deixados dois pares
de pegadas na areia: um era meu e o outro do Senhor.
Quando a última cena da minha vida passou diante de nós, olhei para trás,
para as pegadas na areia, e notei que muitas vezes,
no caminho da minha vida, havia apenas um par de pegadas na areia.
Notei também que isso aconteceu nos momentos mais difíceis
e angustiantes da minha vida.
Isso aborreceu-me deveras e perguntei então ao meu Senhor:
- Senhor, tu não me disseste que, tendo eu resolvido te seguir,
tu andarias sempre comigo,em todo o caminho?
Contudo, notei que durante as maiores tribulações do meu viver,
havia apenas um par de pegadas na areia.
Não compreendo por que nas horas em que eu mais necessitava de ti,
tu me deixaste sozinho.
O Senhor me respondeu:
- Meu querido filho, jamais te deixaria nas horas
de prova e de sofrimento.
Quando viste na areia,apenas um par de pegadas,
eram as minhas.
Foi exatamente aí, que te carreguei nos braços.