segunda-feira, 16 de maio de 2011

O tempo de cada um

Não uso mais relógio, sempre gostei do acessório, tenho alguns da mesma marca que só mudam a cor de fundo e da pulseira (sou capricorniana, quando gostamos de algo é de verdade). O tempo ficou diferente pra mim. Não conto mais as horas, agora conto os meses que faltam pra acabar a quimio. Imagino que sejam uns 3....será? Já fiz 8 quimios...ou só 8?? Helllooou Dra F!!! Dava pra help me here??

Estou tendo os sintomas clássicos. Enjoos, vômitos, cansaço, pele amarela ...estranho não vejo mais viço no meu rosto. Não tem hora, nem lugar: sinto a garganta travando, a coisa sobe goela acima e ploft! Lá vou eu correndo pro banheiro.
Pra tentar evitar tomo Coca-Cola, soube que quando ela foi criada era um xarope que tinha como finalidade evitar enjoo. Funciona ou, ajuda pelo menos! Sempre odiei Coca, agora tomo sem fazer careta.

O catéter incomoda, é feio e me dá a impressão de estar sendo invadida por um alienígena. Mas adoro quando no dia seguinte da quimio acordo e mexo os braços sem o menor problema. Num casamento sábado agora, me apertaram tanto que fiquei com dor nele....não dá pra no auge do abraço do outro falar: "Ai, cuidado com meu monstrinho!!"

Ônus e bônus, a vida é feita deles.

Ao longo desses meses, sinto que entrei num estado de fragilidade que até então desconhecia. Nunca gostei de ser fraca, aquela coisa de mulherzinha chorosa me dava arrepios!! Gosto de ser forte, de dar conta de tudo, de não precisar pedir nada pra ninguém. Venho de uma família de pessoas fortes, lá em casa só minha Mãe era fraquinha. Até que perdemos meu Pai e percebemos a fortaleza que ela sempre foi.

Estou numa onda de casamentos fantástica (todo mundo resolveu casar!)! Quando fui a um deles, num sítio muito lindo, estava conversando com o marido de uma amiga,o Chico. Estava de salto (no meio do mato ou não, é inadmissível não ir de salto a um casório)e me desequilibrei sem querer na grama. Ele estava ao meu lado e me ofereceu o braço. Foi super cavalheiro, e naquele ato eu percebi que eu, que tantos anos andei sozinha, precisava agora de braços me amparando.

E que diferença esses braços fazem!

Uma de minhas filhas tem amigos muito próximos e queridos, mas um ou outro, ainda não conseguiram chegar perto de mim, e isto a aborrece.
Não sei bem pq...eu mesma tenho algumas pessoas que se afastaram. É muito pesado pra alguns. Isso não quer dizer que eles não pensem em mim, ou não se importem com a minha atual condição. Isso quer dizer que eles não são, ou estão, tão fortes pra me encarar.

É simples, mas todo mundo tem seu tempo.E respeitar isso nesse momento da minha vida, believe me...é um aprendizado!!

Às vezes eu tenho saudades de quem eu fui. Do meu dia-a-dia, da minha correria, da minha falta de tempo. Daí me lembro do que a Marta (taróloga) me disse uma vez: "Você vem esses anos numa batida de sobrevivência".

Yeap! É isso mesmo.

Não parava pra pensar se daria pra fazer, fazia o que tinha que ser feito.
Não parava pra olhar como eu estava ficando por dentro, porque isso tomava tempo e energia e meu foco era sobreviver.
Não parava pra olhar pro futuro, o presente estava lá urrando pela minha atenção.
Agora, meu tempo é outro. Ele é quieto, lento, moroso.

Eu espero os meses passarem e fico imaginando como vai ser no Natal, no meu aniversário, no Revéillon....numa época longe do que eu vivo hoje, na qual eu pretendo estar bem e feliz.

Atualmente presto atenção no que sinto e no que penso,e respeito o limite do meu corpo como nunca respeitei.

Hoje fui ao velório do pai de uma amiga. Não me venha com mas não é bom pra vc, vc não está em condições,eu sei a diferença que faz um abraço nessas horas.

Quando a morte ou a possibilidade dela, bate à nossa porta, tudo muda.
Obrigatoriamente paramos pra analisar ganhos e perdas, nossa vida, nossos relacionamentos.
Ficamos frágeis, perdidos, atônitos com a possibilidade de tudo acabar num passe de mágica.

A dor da perda de um parente é devastadora. O buraco que ele deixa ao partir não diminui nunca....a gente é que fica mais forte quando olha pra ele depois de um tempo.

A Bia, uma amiga da Stéphanie está com o pai doente. Ele tem câncer na medula e ainda não encontraram uma medula compatível pra ele.Ela mandou um e-mail pedindo ajuda pros amigos. A Stéphie conseguiu mobilizar a faculdade pra fazer uma campanha de doação. Mas o tempo urge e ele precisa de ajuda (doações na Santa Casa por favor). A fragilidade daquela filha, pedindo ajuda para o pai no e-mail, foi dilacerante...nenhum filho deveria passar pelo medo da perda.

Outra amiga dela, a Lis, perdeu o avô. Mas aí vc pensa: "Ah, ele já tinha idade, já viveu muito!".Será? Pergunte à família o que eles acham dessa linha de raciocínio!

Quem define nosso tempo?
A vida que a gente leva, o que a gente come, o que a gente sente??
Quanto tempo é tempo suficiente?
Quanto afinal é o tempo de cada um?
Até que ponto a vida tem que parar a gente, quando a gente não consegue parar sozinho?

5 comentários:

  1. Lella, adoro seus textos....vc escreve de forma tão descontraída sobre temas pesado....sua forma de ver a vida, vai fazer com que vc dê uma rasteira tão grande nesse câncer que ele vai ficar desconcertado! Tenho certeza absoluta disso!!!!!! E qto à químio, picolé de limão e de uva, melancia e suco de limão eram as coisas qe a Mari conseguia comer e tomar, acho que vale variar. Um beijo e fica com Deus!

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  2. Lela,
    A gente deveria sempre reavaliar o que realmente é importa nesta vida!!!

    Mil bjs

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  3. Lela,
    Li alguns dos seus textos (assim que tiver tempo vou continuar), tempo... rs. Adorei o jeito que vc. relata suas experiências, mas incrível é sua demonstração de força e garra. Você estará em nossas orações e continue assim: FORTE.

    Abçs
    Alexandre Campos Salles

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  4. Bella Lella;
    Essa coisa de respeito ao tempo de cada um...
    Conosco acontece o inverso, mas eu respeito, mesmo que contra minha vontade, mas não por muito tempo rsrsr
    De vez em quando ligo, pergunto, sugiro etc.
    Quando quiser, sinceramente, me chame, caso contrário vou continuar "me oferecendo" rsrsrs
    Agora encerro com uma saudação que era trocada num certo grupo de amigos (acho q já contei a história pra vc):
    SANIDADE E SERENIDADE.

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  5. filha, lembra quando vc tinha 7 anos e junto com a wania, vcs almoçavam na vovó beth e naquele momento eu voltava do curso objetivo, aí a vovó falava pra mim parar de encher o saco de vcs duas e falavam: tiooo não enche. aí eu levava vcs até o são judas.pois é filha, se vc soubesse quantas saudades eu sinto daquela época que jamais voltará. valéria teu tio te ama muito, e você sabe disso, um GRANDE beijo filha.

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